
Conta offshore é legal para brasileiros
julho 21, 2025Vamos ser honestos. Quando você ouve a expressão “conta offshore”, sua mente não desenha um gráfico de investimentos. Ela projeta uma manchete de jornal. Letras garrafais. A foto de um político. A palavra “escândalo”.
A pergunta, então, é quase um sussurro culpado: mas… ter uma conta dessas… é legal para um brasileiro comum?
A resposta é curta. E talvez surpreendente.
Sim. É perfeitamente legal.
O problema é que essa história não acaba no ponto final. Na verdade, é aí que ela começa. A legalidade de uma conta no exterior não mora no ato de abri-la, mas na disciplina de contar para o governo brasileiro que ela existe. Tudo se resume a uma única palavra: declaração.
A Regra de Ouro: O que o Leão Realmente Quer Saber
O Leão não quer impedir você de ter dinheiro lá fora. Ele só quer saber que esse dinheiro existe, de onde ele veio e se os impostos sobre seus rendimentos foram pagos. É um conceito simples, mas que por décadas foi convenientemente ignorado por quem buscava as sombras dos paraísos fiscais.
“O erro das pessoas é pensar no ato, não na consequência”, me disse um advogado tributarista, com a paciência de quem repete a mesma aula há vinte anos. “Ter a conta? Irrelevante para a lei. Não contar para a Receita que você tem a conta? Aí, meu amigo, você arrumou um problema. E um problema caro.”
O processo, em tese, é direto. Na sua Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física (DIRPF), aquela que você entrega todo ano, é preciso ir na ficha de “Bens e Direitos” e informar o saldo da sua conta no exterior em 31 de dezembro do ano anterior, convertido para reais. Se a conta rendeu juros ou dividendos, esses ganhos também precisam ser declarados e tributados.
E tem mais. Se o total dos seus bens lá fora – somando contas, investimentos e imóveis – ultrapassar o patamar de 1 milhão de dólares, surge outra obrigação: a Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior (CBE), entregue anualmente ao Banco Central.
Não fazer isso é onde a legalidade se desfaz. As multas são pesadas, podendo chegar a percentuais altíssimos sobre os valores não declarados. Além do risco de responder criminalmente por evasão de divisas. A matemática é simples: a transparência custa um pouco de tempo; a opacidade pode custar uma fortuna.
Por que a Fama é Tão Ruim?
Se é legal, por que a fama da conta offshore é digna de um vilão de cinema? Porque, por anos, ela foi a ferramenta de escolha para quem tinha algo a esconder. É como uma faca de cozinha: um objeto perfeitamente legal, indispensável para o chef, mas que nas mãos erradas vira uma arma. A culpa não é da faca.
Os grandes escândalos de corrupção, da Lava Jato aos vazamentos internacionais de dados como os Panama Papers, tinham um elemento em comum: o uso de contas e empresas offshore para ocultar dinheiro de propina, lavar recursos ilícitos e fugir do Fisco. A ferramenta foi tão usada para o crime que a sua imagem ficou contaminada por associação.
O que mudou drasticamente nos últimos anos foi a capacidade de fiscalização. Acordos de troca automática de informações entre mais de 100 países, incluindo tradicionais paraísos fiscais, tornaram o sigilo bancário uma relíquia do passado. Hoje, o banco suíço ou caribenho informa automaticamente a Receita Federal brasileira sobre as contas de residentes do Brasil. Tentar se esconder ficou quase impossível.
O jogo mudou. A escuridão está sendo inundada por luz.
“Declarei e durmo em paz”: A Normalização da Conta no Exterior
A consequência dessa nova era de transparência é uma surpreendente normalização. Falei com Roberto, um arquiteto de 50 anos que investe uma parte de suas economias no exterior há cinco anos. Para ele, o processo é rotineiro.
“No começo, confesso que dava um frio na barriga. A gente ouve tanta história…”, ele admite. “Mas eu contratei uma contabilidade que entende do assunto no primeiro ano, aprendi como se faz, e hoje é só mais uma parte da minha declaração. É como declarar um carro ou um apartamento, só que com o código do país na frente.”
Essa paz de espírito é o principal dividendo da legalidade. É a certeza de que seu patrimônio, conquistado com trabalho, está protegido e, ao mesmo tempo, em conformidade com a lei. Não há o que temer de uma fiscalização ou de uma notificação do Leão.
No fim das contas, a legalidade da conta offshore nunca esteve em dúvida na letra da lei. O que estava em dúvida era a disposição das pessoas em cumpri-la e a capacidade do Estado em fiscalizar. Ambas as coisas mudaram. A palavra “offshore” pode até continuar soando como algo proibido nas conversas de bar, mas na prática de um número crescente de brasileiros, ela está se tornando o que sempre deveria ter sido: apenas mais uma linha na declaração de imposto de renda.